Por
José Romero Araújo Cardoso
A
descoberta precoce de metais preciosos nas colônias espanholas na América foi a
principal responsável pelo sucesso da empresa agrícola no ensejo da colonização
brasileira sob a égide da concentração mercantilista portuguesa na produção
açucareira.
Portugal,
antes concentrado quase exclusivamente no rico comércio das especiarias do
oriente, começou a colonizar a parte que lhe coube com o Tratado de Tordesilhas
trinta anos depois da descoberta das terras brasileiras.
Representação de antigo engenho. Fonte: José Romero.
Para
que o engenho de banguê obtivesse sucesso teve que implementar as bases da
plantation enquanto alicerces da formação sócio-econômica-espacial, calcadas no
latifúndio, no trabalho escravo e na monocultura canavieira.
Esse
último pilar foi exigente no que tange à destruição da mata nativa encontrada
pelos lusitanos na faixa litorânea, pois a imponência do capeamento vegetal
era-lhes empecilho para que as prerrogativas de consumo que embasavam exigentes
agentes econômicos da velha Europa que gradativamente se livrava das amarras
impostas pelo complexo período medieval dominado por dogmas e preceitos
religiosos.
Estendendo-se
dos atuais Estados do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul, a mata
atlântica revelou-se como um dos mais ricos biomas do planeta, sendo habitat de
espécies animais e vegetais endêmicas, as quais, gradativamente, foram sendo
relacionadas entre as mais ameaçadas em todo globo.
Mapa do bioma Mata Atlântica no Brasil. Em 1500 e nos dias atuais. Fonte: SOS Mata Atlântica.
A
grande experiência Batava no comércio do açúcar na Europa foi aliada
incondicional para a ampliação da catástrofe ambiental que começou a se
delinear quando da implantação da empresa agrícola no Brasil, pois sinônimo de
bons lucros, não tardou para que os Portugueses implementassem a retirada
criminosa de espécies vegetais de grande porte a fim de ceder lugar aos
plantios canavieiros.
Penalização
significativa recaiu inicialmente sobre a atual região da zona da mata
nordestina, pois dotada de condições edafoclimáticas favorabilíssimas para a
monocultura canavieira, imperando o solo de massapê e precipitações
pluviométricas anuais superiores a 1.000 mm, revelou-se naturalmente propícias
para o sucesso do empreendimento mercantilista lusitano assessorado pelos
interesses econômicos dos vigilantes comerciantes dos países baixos.
Espécies
nativas como Pau Ferro (Caesalpinia férrea), Pau Jacaré (Piptadenia gonoacantha), Cedro Rosa (Cedrela
fissilis), entre centenas de outras encontradas em profusão na região foram
brutalmente arrancadas, deixando ainda inúmeras espécies animais sem o habitat
natural.
Floresta Ombrófila Densa. Fonte: Professor José Romero.
Diferente do semiárido, onde antigos colonos utilizaram
espécies vegetais com objetivos de implementar a sobrevivência, a exemplo do
que ocorreu com a aroeira (Schinus terebinthifolius), cujo miolo serviu para
que a engenhosidade sertaneja fizesse surgir prensas para obter a cera de
carnaúba (Copernicia prunifera), na mata atlântica foi mínimo o aproveitamento
das espécies vegetais do bioma. Para tanto, observar o site
http://www.museudosertao.com.br. O artesanato que surgiu na região de mata
atlântica foi mais contemplativo. Na maioria das vezes havia o descarte puro e
simples das árvores cortadas, queimando-as ou jogando-as ao mar.
Os mesmos Batavos, imprescindíveis no processo da cadeia
produtiva do açúcar brasileiro, responsabilizaram pelo recrudescimento da
destruição da mata atlântica quando invadiram o nordeste brasileiro em 1630 e
intensificaram a exploração da terra, visando exponencializar a produção.
A expulsão holandesa do nordeste brasileiro e a concorrência
que começou a ser feita com o açúcar produzido nas Antilhas
responsabilizaram-se pela decadência do engenho de banguê que tanto ônus
ambiental ocasionou na mata atlântica.
Desastre ambiental sem paralelo foi levado avante pelas
usinas, sucessoras da empresa agrícola colonial, quando o programa energético alternativo
brasileiro, enquanto resposta à crise do petróleo, exigiu que novas terras,
sobretudo as localizadas nos tabuleiros costeiros, fossem incorporadas aos
latifúndios, sacrificando vidas humanas e a biodiversidade existente.
Contando nos dias atuais com apenas 8,5% de suas florestas
originais, a mata atlântica é cotidianamente vítima de inúmeras agressões, as
quais vão da especulação imobiliária ao desmatamento indiscriminado, intuindo
obter material lenhoso para alimentar a construção civil, padarias, olarias,
etc.
Proteger e lutar pela permanência da mata atlântica significa
enfatizar preito de gratidão ao grande bioma brasileiro que tanto tem se
revelado útil para um grande número de pessoas que dependem de córregos, rios e
nascentes d´águas espalhados pela costa brasileira.
José Romero Araújo Cardoso. Geógrafo. Professor-Adjunto IV do Departamento de geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Contato: romero.cardoso@gmail.com
Edição: Diôgo da Silva Santos
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